quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Arte e espaço de exibição - Parte 2


A clarabóia do vão central do CCBB-SP com a cortina de plástico de Cristiano Rennó.
As amarrações da cortina e o piso de mosaico.
A entrada do CCBB-SP com as franjas da cortina.


A primeira impressão ao adentrar a mostra “Planos de Fuga” no CCBB-SP, em cartaz até o início do mês de janeiro de 2013, foi a de um centro cultural fantasma, como que desativado. Esse estranhamento fazia sentido pois o próprio prédio do CCBB - suas instalações e distribuição funcional - eram o próprio objeto das intervenções artísticas ali presentes.

Na entrada, a cortina de Cristiano Rennó – centenas de fitas de plástico em amarelo e vermelho vivos, amarradas no guarda-corpo do terceiro andar e caindo até a metade do pé-direito do piso inferior. Apenas nós e amarras sustentam essa estrutura, que ora destaca os elementos decorativos do prédio, ora impedem a visão do visitante do vão central, como se o escondesse.

No porão, onde fica o antigo cofre, a instalação que mais me impressionou pelo deslocamento e absoluta mudança de signos operados nesse espaço. A espanhola Sara Ramo arranca fora todo o acabamento do recinto, transformando o piso inferior num labiríntico canteiro de obras, com tijolos, madeira, cimento, e pilhas de lixo aparentes (lixo, aliás, proveniente da montagem da exposição), com direito até a um vestiário improvisado de pedreiros fictícios, onde roupas e pertences estão arranjados e pendurados. O cofre é um elemento à parte em termos de intensidade – sua passagem encontra-se bloqueada, e ao termos acesso a ele por um desvio, deparamo-nos com um ambiente iluminado com uma forte luz amarela, refletindo pilhas de forração com spray dourado, como um ouro dos tolos, o tesouro dos iludidos.

No último andar, Cildo Meireles executa pela primeira vez no Brasil a instalação “Ocasião”, concebida na década de 70, mas só realizada em 2004, em Frankfurt. Duas salas separadas por um longo e sinuoso caminho. E um conjunto de espelhos. Na primeira, o visitante pode observar seu reflexo em cada uma das 4 paredes, visualizando, no centro, um pote cheio de cédulas de reais. Na outra sala, depois de passar ao largo da clarabóia de luz natural, o visitante pode ver os indivíduos que estão na primeira sala sem ser visto, como no mecanismo de identificação de suspeitos efetuado pela policia. Ato contínuo, o observador procura imaginar como seu comportamento foi captado e visto, minutos antes, por quem quer que estivesse por trás dos espelhos naquele primeiro momento. Espaço e tempo conjuntamente deslocados.

Gabriel Sierra e Marcius Galan brincam com elementos cenográficos no primeiro andar. O primeiro revela o ambiente através de paredes falsas com aberturas recortadas no meio; o segundo joga com a camuflagem, reproduzindo cenicamente os elevadores e displays da recepção (houve relatos de monitores de que visitantes chegaram a se confundir com essas fachadas fake).

Os únicos artistas cujas obras não foram executados ou adaptadas intencionalmente para o espaço do prédio do CCBB-SP são os norte-americanos Gordon Matta-Clark e Robert Kinmont, e a suíça Claudia Andujar. Eles representam um núcleo mais histórico, dada a consistência de seus currículos e por trazer outras perspectivas da interação do indivíduo e seu meio-ambiente, seja cidade, rua, paisagem, casa (Matta-Clark merecerá um post à parte, pois seu trabalho site-specific ainda hoje é muito revolucionário).

A arte, em muitas situações, só ganha força de sentidos no contexto em que ela é realizada. A grande maioria do que está dentro do CCBB-SP, do que está em obras em “Planos de Fuga”, não pode ser imaginado fora dali. Fugimos do museu, do centro cultural que costumeiramente desempenha o papel de abrigo de exposições, para um tempo e espaço fora do cronológico e do funcional, respectivamente. Entramos numa obra de arte.
PS - ifotos minhas...
Primeira sala de espelhos da instalação "Ocasião", de Cildo Meireles, com o pote de louça esmaltada no centro. Estamos brincando sem saber que somos observados
Cenografia de paredes vazadas do colombiano Gabriel Sierra.

O amontoado de forração dourada na instalação de Sara Ramo dentro do cofre da antiga agência bancária do Banco do Brasil / CCBB-SP

As roupas de pedreiro no canteiro de obras no qual o subsolo do CCBB foi transformado.






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