quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Aceite o frio na barriga...

Daniel (Luke Kirby) e Margo (Michelle Williams) numa das sequências mais poéticas do novo longa da canadense Sarah Polley, "Entre o Amor e a Paixão".
Em 2006 a atriz canadense Sarah Polley fez sua estreia na direção e roteirização de um longa de ficção. “Longe Dela” é um filme sensível, sobre um casal juntos há mais de quarenta anos, forçado a lidar com o Alzheimer que começa a atacar a esposa, vivida por Julie Christie, por cujo papel ela concorreu a um Oscar de melhor atriz.  

Em “Entre o Amor e a Paixão” (2011) – pra variar mais uma infeliz tradução para o português do original Take This Waltz – Polley continua interessada no tema do amor, nas relações homem-mulher. Margo (Michelle Williams) é uma escritora que não sabe sobre o que quer escrever. Casada há 5 anos com Lou (Seth Rogen), ela ainda é bem jovem (28 anos), e se questiona sobre se a vida deve ter, de fato, sentido e significado para tudo, ou se apenas temos que admitir que certas – ou muitas – coisas são vazias e inexplicáveis em nossa existência.

Nessa busca por preencher tudo, por algo além do que a morna felicidade e segurança garantida por seu casamento, Margo tem medo de ter medo, de ficar entre duas coisas, deslocada. Existe ainda um lugar em seu coração, um espaço a ser preenchido pela paixão e o desejo. É aí que entra Daniel (Luke Kirby), um estranho que Margo encontra casualmente no avião, voltando para sua casa em Toronto, e que ela descobre ser seu vizinho de rua. Como ela, Daniel é um artista que tem medo de se arriscar, de se expor, e sobrevive conduzindo turistas em um riquixá (isso mesmo, aquele carrinho oriental de duas rodas, com assento para dois, e puxado por um indivíduo).

A trama se desenvolve sob o prisma de Margo, uma visão essencialmente feminina, focada no contraste de pequenos detalhes e seus ecos e reverberações em outras seqüências do filme. Margo se esforça para seduzir Lou por meio de brincadeiras e piadas, situações quotidianas aparentemente simples e tolas, mas que representam sua tentativa de despertar nela mesma o desejo sexual já em cinzas por seu marido. Contrastando com o fracasso de suas ações em relação a Lou, Daniel descreve, de forma detalhada, na mesa de um bar, como ele gostaria de transar de maneira intensa com ela.  

O real estado entre duas coisas está colocado para Margo – Lou, o marido fiel e tranqüilo; Daniel, o homem vibrante e poético. Não há como evitar o medo de ter medo, e fazer suas escolhas. Ou ainda, fantasiá-las.

Aceite você também essa valsa, e veja como o triângulo Margo – Lou – Daniel nos é muito familiar ao representar nosso medo de abraçar a liberdade, o medo da falta de segurança.

Sempre vamos ter de lidar com uma dose de insatisfação, de não-plenitude, ao longo da vida; porém, temos muitos recursos a nosso alcance para não sermos, definitivamente, infelizes “Madames Bovarys”.  



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