Domingo agora, dia 28, acontece o segundo round da mostra "Brasil Tela Para Todos - Perspectivas Contemporâneas". Uma mostra sobre a qual não canso de falar sobre, de repetir a respeito. Sou suspeito, então não preciso de alibis. Concebi e produzo a mostra junto com a Marilia, minha sócia, e a Mari Cruz, nossa produtora. Temos um nome: convergenciacultural, assim mesmo, em minúsculo, tudo corrido. É uma empreitada relativamente nova como sociedade, mas já bem amadurecida. Não temos chefe agora - pequenas empresas, grandes negócios. Temos sonhos possíveis de serem realizados. Possíveis de crescerem na prática. Assim queira Zeus e Deus e Oxalá. E São Francisco de Assis, padroeiro dos meus filhos felinos.
O "Brasil Tela Para Todos" nasceu de uma vontade do CCBB de São Paulo de dar espaço para o cinema nacional em sua programação audiovisual. O nome tem um quê de bolsa-família, mas defendo-o. Quem tem condições de ir a um cinema hoje em dia? Digo, pagar uma entrada cheia, sem carteirinha de estudante falsificada, mais o estacionamento ou a condução (isso sem contar a pipoca e o "refri")? E em quantas salas de exibição vemos filmes brasileiros? E quais filmes? É um dado real que não há tela para todos. Por isso a vocação da mostra: aproximar o grande público das produções nacionais contemporâneas, mais recentes, a cada mês subdivididas em temas ou gêneros. E como o objetivo é formação de público, temos de sucessos de bilheteria e crítica até filmes menores, que não conseguiram visibilidade suficiente para serem conhecidos. Filmes feitos por jovens realizadores, filmes que tiveram alguma repercussão internacional, filmes que tratam de diferentes aspectos do Brasil e de sua história.
Para o mês de julho, escolhemos o gênero road-movie como tema da mostra. No próximo domingo serão exibidos "Central do Brasil" (1998), de Walter Salles; "Uma Longa Viagem"(2011), de Lucia Murat, e "Além da Estrada"(2010), de Charly Braun. De "Easy Rider" a "On the Road", passando por "Bye Bye Brasil" ou "Thelma e Louise", os filmes de estrada tornaram-se um gênero em si pelo próprio apelo metafórico que uma viagem tem. Viajar significa buscar uma experiência nova, espairecer, ir atrás de algo, recuperar esse algo e, inconscientemente, estar aberto ao inesperado e imprevisível. Uma viagem nos coloca frente ao dilema entre a dificuldade de mudarmos e o desapego oferecido pela estrada, que sempre deixa algo para trás.
Nos 3 filmes selecionados, há essa procura: por uma outra chance na vida, por um lar, pelas memórias pessoais e da história de um país, pelo frio na barriga do futuro em aberto.
Como os filmes de viagem, o "Brasil Tela Para Todos" não se pretende totalizante, absoluto, unívoco. É uma mostra com o pé na estrada mesmo, aberta para erros e acertos, para a livre recepção do público, para o diálogo com o espectador. É uma perspectiva, uma visada entre tantas, que, como num cenário de viagem, cambiará a cada mês. Seguimos adiante e ficaremos muito contentes se vocês forem subindo nessa boléia. Não tem pressa...
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quarta-feira, 24 de julho de 2013
tá na estrada, então segue...
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quinta-feira, 17 de janeiro de 2013
corpos ardentes...
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Escultura suicida da instalação "Event Horizon", concebida em 2007, no skyline de São Paulo como parte da exibição "Corpos Presentes", de Antony Gormley, no CCBB-SP. |
Escultura de Gormley na frente do prédio do CCBB-SP, num domingo em que os ciclistas não pensaram 2 vezes onde amarrar suas bikes (iphoto minha). |
Foi necessária uma estrutura externa ao prédio do CCBB-SP para sustentar o conjunto de esculturas pendentes de Gormley no vão interno (iphoto minha). |
A perspectiva do 2o. andar do vão central do CCBB-SP das esculturas pendentes (iphoto minha). |
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Perspectiva do cima para baixo (iphoto minha). |
Cruz maciça em que as mãos e os pés de Cristo estão em 3D (iphoto minha). |
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Perspectiva lateral das esculturas da expo "Corpos Presentes", de Antony Gormley, no hall de entrada do CCBB-SP. |
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As esculturas humanas de Gormley na Tate Modern - outra composição e forma de interação com o espaço. |
As esculturas de Antony Gormley transmitem essa ideia sem grandes necessidades de mediação. É um impacto quase que imediato, entre os corpos esculpidos em diferentes tamanhos, posições, formatos e técnicas, e o espaço ao redor. Seja esse espaço dentro de uma galeria, seja o das ruas e edifícios de uma cidade.
Em 2012, a exposição "Corpos Presentes", coletânea dos principais trabalhos de Antony Gormley, escultor britânico de fama internacional, ocupou o CCBB de São Paulo (depois o CCBB-Rio, e até o início do ano estava no CCBB-Brasilia)
Um prédio do início do século XX, construído dentro da concepção clássica da época, fruto da prosperidade econômica trazida pelo café.
Além do interior do centro cultural, os bonecos-homens de Gormley, na instalação "Event Horizon", realizada anteriormente em Londres e Nova York, ocuparam as ruas e os topos de edifício do centro de São Paulo. Não havia como evitar a contundência dessas formas, desses corpos. Aglomeradas numa estrutura pendente do alto da clarabóia do edifício e ao longo do hall de entrada, as esculturas em ferro das mesmas proporções que as do corpo do artista se dispunham como um índice de posições corporais, de sentimentos humanos. Na frente do prédio, uma escultura em pose ereta, com a qual qualquer pedestre podia brincar - vesti-la, pixá-la, colocar chapéu, boné, amarrar bicicletas (era uma determinação do próprio Gormley). Ao redor do CCBB, esculturas suicidas distribuídas em cima dos edifícios, que podiam ser vistas do Vale do Anhangabaú, do Viaduto do Chá, da Praça do Patriarca, da Praça Ramos.
As esculturas de Gormley têm esse poder de nos guiar o olho. Tanto para elas próprias como para o contexto espacial e urbano no qual elas estão dispostas. O prédio de inspiração clássica art-nouveau do CCBB de São Paulo se deu a perceber para os espectadores da exposição de uma outra maneira, assim como o entorno urbano do centro de São Paulo. Uma paisagem que antes passava despercebida passou a ser notada. Sem necessidade de mapas ou sinais de indicação...
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Escultura em tamanho gigante de homem de cócoras concebida por Gormley para as terras baixas da Holanda. |
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A mesma escultura na proporção das medidas do corpo do artista (veio para a exibição do CCBB). |
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"Anjo do Norte", em Gateshead, Reino Unido. |
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sexta-feira, 28 de dezembro de 2012
O CCBB e os melhores de 2012
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Banner na fachada do prédio do CCBB de São Paulo, reprodução da obra de Édouard Manet, também capa do catálogo da mostra "Impressionismo - Parias e a Modernidade" |
O CCBB de São Paulo, em conjunto com os demais centros culturais do Banco do Brasil espalhados entre Rio, Brasilia, e o recém-inaugurado de Belo Horizonte, têm mostrado um trabalho consistente não apenas no âmbito das artes visuais, mas também nas artes cênicas, mostras de cinema e eventos literários, como palestras e mesas redondas, bate-papos com autores e artistas em geral.
Pode-se fazer uma crítica à linha curatorial escolhida pela instituição: de que ela tem privilegiado exibições de grande impacto midiático, com retorno garantido de marketing indireto para o banco, em vez de fomentar artistas menos conhecidos. Ok. Mas penso que, dentro das limitações de minimização de riscos impostas por uma organização financeira, o que os CCBBs vêm fazendo tem sua dose de ousadia. Sobretudo no quesito formação de público, dando a oportunidade ao espectador em geral de apreciar não apenas obras consagradas que raramente poderão ser revistas no país, como a dos impressionistas, como também trazer ao conhecimento do grande público nomes de grande estatura conceitual e formal da artes visuais contemporânea como a alemã Rebecca Horn e o inglês Antony Gormley, por exemplo (houve ainda a expo do Escher, e temos a que está atualmente em cartaz, muito bem alinhavada em termos de concepção).
A meu ver, é dever de um centro cultural com essa envergadura tornar as artes visuais acessível ao grande público. Mostrar que é apenas uma questão de hábito formarmos nosso gosto estético, aprendermos a apreciar arte. Não há nada de intelectualizado nisso. Por isso, não ratifico opiniões dadas por alguns críticos de que o CCBB torna a arte pop, vulgar, pelo barulho causado pela mostra dos impressionistas. Ter contato frente à frente com uma tela de Degas, de Monet, vários Renoir, é um privilégio que não deve ser restrito a poucos.
Defendo a desmitificação do objeto artístico. Não em seu encantamento, em seu conteúdo e forma, mas no seu caráter de acessibilidade e comunicação com o espectador. Arte não é coisa de outro mundo. É coisa do mundo de cada um de nós, desde o crochê das nossas avós até as esculturas monumentais de Gormley (que, para mim, foi o destaque das exibições feitas pelo CCBB esse ano).
De qualquer forma, parabéns ao centro cultural do Banco do Brasil.
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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
Arte e espaço de exibição - Parte 2
A clarabóia do vão central do CCBB-SP com a cortina de plástico de Cristiano Rennó. |
As amarrações da cortina e o piso de mosaico. |
A entrada do CCBB-SP com as franjas da cortina. |
A primeira impressão ao adentrar a mostra “Planos de Fuga”
no CCBB-SP, em cartaz até o início do mês de janeiro de 2013, foi a de um centro
cultural fantasma, como que desativado. Esse estranhamento fazia sentido pois o
próprio prédio do CCBB - suas instalações e distribuição funcional - eram o
próprio objeto das intervenções artísticas ali presentes.
Na entrada, a cortina de Cristiano Rennó – centenas de
fitas de plástico em amarelo e vermelho vivos, amarradas no guarda-corpo do terceiro
andar e caindo até a metade do pé-direito do piso inferior. Apenas nós e
amarras sustentam essa estrutura, que ora destaca os elementos decorativos do
prédio, ora impedem a visão do visitante do vão central, como se o escondesse.
No porão, onde fica o antigo cofre, a instalação que mais me
impressionou pelo deslocamento e absoluta mudança de signos operados nesse
espaço. A espanhola Sara Ramo arranca fora todo o acabamento do recinto,
transformando o piso inferior num labiríntico canteiro de obras, com
tijolos, madeira, cimento, e pilhas de lixo aparentes (lixo, aliás, proveniente
da montagem da exposição), com direito até a um vestiário improvisado de pedreiros
fictícios, onde roupas e pertences estão arranjados e pendurados. O cofre é um
elemento à parte em termos de intensidade – sua passagem encontra-se bloqueada,
e ao termos acesso a ele por um desvio, deparamo-nos com um ambiente iluminado
com uma forte luz amarela, refletindo pilhas de forração com spray dourado,
como um ouro dos tolos, o tesouro dos iludidos.
No último andar, Cildo Meireles executa pela primeira vez no
Brasil a instalação “Ocasião”, concebida na década de 70, mas só realizada em
2004, em Frankfurt. Duas salas separadas por um longo e sinuoso caminho. E um
conjunto de espelhos. Na primeira, o visitante pode observar seu reflexo em
cada uma das 4 paredes, visualizando, no centro, um pote cheio de cédulas de
reais. Na outra sala, depois de passar ao largo da clarabóia de luz natural, o
visitante pode ver os indivíduos que estão na primeira sala sem ser visto, como
no mecanismo de identificação de suspeitos efetuado pela policia. Ato contínuo,
o observador procura imaginar como seu comportamento foi captado e visto,
minutos antes, por quem quer que estivesse por trás dos espelhos naquele
primeiro momento. Espaço e tempo conjuntamente deslocados.
Gabriel Sierra e Marcius Galan brincam com elementos
cenográficos no primeiro andar. O primeiro revela o ambiente através de paredes falsas com
aberturas recortadas no meio; o segundo joga com a camuflagem, reproduzindo cenicamente os
elevadores e displays da recepção (houve relatos de monitores de que visitantes
chegaram a se confundir com essas fachadas fake).
Os únicos artistas cujas obras não foram executados ou
adaptadas intencionalmente para o espaço do prédio do CCBB-SP são os
norte-americanos Gordon Matta-Clark e Robert Kinmont, e a suíça Claudia Andujar.
Eles representam um núcleo mais histórico, dada a consistência de seus
currículos e por trazer outras perspectivas da interação do indivíduo e seu meio-ambiente,
seja cidade, rua, paisagem, casa (Matta-Clark merecerá um post à parte, pois
seu trabalho site-specific ainda hoje
é muito revolucionário).
A arte, em muitas situações, só ganha força de sentidos no
contexto em que ela é realizada. A grande maioria do que está dentro do
CCBB-SP, do que está em obras em “Planos de Fuga”, não pode ser imaginado fora dali.
Fugimos do museu, do centro cultural que costumeiramente desempenha o papel de
abrigo de exposições, para um tempo e espaço fora do cronológico e do
funcional, respectivamente. Entramos numa obra de arte.
PS - ifotos minhas...
PS - ifotos minhas...
Primeira sala de espelhos da instalação "Ocasião", de Cildo Meireles, com o pote de louça esmaltada no centro. Estamos brincando sem saber que somos observados |
Cenografia de paredes vazadas do colombiano Gabriel Sierra. |
O amontoado de forração dourada na instalação de Sara Ramo dentro do cofre da antiga agência bancária do Banco do Brasil / CCBB-SP |
As roupas de pedreiro no canteiro de obras no qual o subsolo do CCBB foi transformado. |
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