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segunda-feira, 15 de abril de 2013

a pinacoteca do estado de são paulo...

Fachada da entrada da Pinacoteca do Estado de São Paulo: o projeto de Paulo Mendes da Rocha deslocou para a lateral do prédio o acesso do público ao interior do museu.
Ontem o dia estava nublado, chuvoso até. Fazia frio. E a Pinacoteca estava cheia de gente. Grupos de estudantes que faziam visitas guiadas com os monitores do "educativo"; muitos estrangeiros - visível o aumento do fluxo de estrangeiros não mais apenas a passeio em São Paulo, mas, de fato, instalando-se por aqui -, mais um punhado de gente esparsa que, se fosse feita uma pesquisa, saberíamos que se trata de um público relativamente recente a frequentar espaços culturais e museus como a Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Museu de arte mais antigo da cidade, com uma vasta e consistente coleção de arte brasileira abrangendo, na linha do tempo, desde o século XIX até os dias de hoje, a Pinacoteca ocupa o prédio da ex-sede do Liceu de Artes e Ofícios, projetado pelo escritório do arquiteto Ramos de Azevedo. Na década de 90, esse prédio sofreu uma ampla reforma, um extenso e detalhado projeto de Paulo Mendes da Rocha que modernizou e amplificou todo o espaço, desde a fachada, o acesso do público, até a iluminação e o display interno das salas de exposição, reserva técnica, escritórios, café. 

Mesmo que você não se informe de antemão sobre o que está em exibição na Pinacoteca, visitá-la é um programa cultural per se. Só andar pelo espaço interno, as galerias vazadas, as passarelas, o octógono central, voltado para a arte contemporânea, já vale o deslocamento.

Outro grande destaque é o acervo de pinturas e esculturas, em exibição permanente. O modo de exibição desse acervo - sobretudo as pinturas - é didático e muito bem-sucedido em mostrar os gêneros consolidados da técnica pictórica ao longo da história da arte - natureza-morta, marinhas, retratos e autorretratos, cenas históricas e quotidianas, iconografia regional, mitologia greco-romana e bíblica - e como eles foram apropriados pelos pintores brasileiros. É possível visualizar a variedade e qualidade da pintura brasileira exercitada em cada um desses gêneros, a influência das belas artes européias e, acima de tudo, o desenvolvimento de um vocabulário e sintaxe próprias.  (destaco, aqui, Almeida Júnior, Pedro Alexandrino, Oscar Pereira da Silva e Antonio Parreiras, artistas que viveram e trabalharam na cidade de São Paulo). 

De exposições temporárias, temos a instalação-coleção Fabíola, do belga radicado no México, Francis Alys; uma mostra de 30 obras de Sérgio Sister, incluindo suas séries mais recentes de caixas e ripas-molduras; uma seleção de fotografias do dominicano Natálio Puras penzo, aka Apeco; o artista português Vasco Araújo; e uma perspectiva da produção artística de presos políticos na época da ditadura militar no Brasil, denominada "Insurreições". Muita coisa. Variada, crítica, um caleidoscópio bem selecionado que demonstra a vocação plural da Pinacoteca, e seu compromisso com a formação de público, com a arte contemporânea, o intercâmbio cultural e a contextos críticos do fazer artístico. 

Termino com fotos do acervo de esculturas (sei o que muitos vão dizer, já está mais do que na hora de ter uma máquina decente e parar com essas fotos de celular...).
"Gazela", de Eugênio Pratti (1889-1979), bronze, sem data.
"Autorretrato", de Amadeu Zani, 1869-1944, bronze, 1931.
"Sem Título", torso de Victor Brecheret, 1894-1955, bronze, 1930.
"Dois Nus Femininos Entrelaçados", de João Pedrosa, 1915-2002, bronze,  1940/1989.
"Sem Título", de Amilcar de Castro, 1920-2002, aço bruto, 2000.
"Guanabara", de Alfredo Ceschiatti, 1918-1989, bronze, 1969.
"Atleta em Descanso", de João Batista Ferri, 1896-1978, granito rosa, sem data.
"Prometeu Acorrentado", de Bruno Giorgi, 1905-1993, bronze, sem data.
"Homem Andando", de Ernesto de Fiori, 1884-1945, bronze, cerca de 1945.
"Leda", de Lélio Coluccini, 1907-1983, bronze, 1950.
"Apóstolo São Paulo", de Décio Villares, 1851-1931, bronze, sem data.
"Eva Mulata", de Ottone Zorlini, 1891-1967, pedra serena toscana, sem data.
"Moema", de Rodolfo Bernardelli, 1852-1931, bronze, 1895/1998.
"Sapho", de Leopoldo e Silva, 1879-1948, mármore, c. 1915.
"Primavera", de Raphael Galvez, 1907-1998, gesso, 1939.
"O Brasileiro", de Raphael Galvez, 1907-1998, gesso, 1940.
"O Homem que Anda sobre a Coluna", de Auguste Rodin, 1840-1917, bronze, 1877.

sábado, 30 de março de 2013

esperando bjork...

"Cubo branco" é um termo criado pelo artista e crítico norte-americano Brian O'Doherty para designar espaços expositivos concebidos para que as obras neles instaladas sejam apreciadas supostamente sem nenhuma interferência exterior a elas. Um mundo à parte, uma caixa fora do tempo e do espaço. 

Curioso é pensar que o anexo do atual MAC-USP, antigo prédio do DETRAN, obra de Oscar Niemeyer, havia sido pensado originariamente como uma interação entre natureza e realização humana, luz natural e a rede de pilotis de concreto branco. No entanto, esse local, já ocupado literalmente por uma kafkiana repartição pública brasileira, acabou sendo transformado, de fato, num "cubo branco". Explico: um sistema de ar condicionado e paredes de drywall foram comprados para o espaço do prédio anexo, acabando, assim, com o efeito orgânico pensado por Niemeyer (kafkiana também é a maneira pouco clara em que esse equipamento foi adquirido, uma vez que a ideia original era manter a proposta do arquiteto). De qualquer forma, é impressionante a galeria de exposição montada ao final. Um verdadeiro cubo branco, imponente e arrojado, um dos melhores espaços de exibição vistos recentemente. 

A inauguração do cubo branco do prédio anexo ao MAC-USP, a meu ver, não poderia ter sido mais feliz. Carlito Carvalhosa interveio nesse espaço com a instalação site-specific denominada "Sala de Espera". São dezenas de grandes postes de madeira antigos, anteriormente destinados à rede elétrica da cidade. Dispostos em diagonal e horizontal, cruzando-se entre si, os postes formam uma contraposição à verticalidade e limpeza dos pilotis brancos de Niemeyer. Operou-se como um desvirginar do cubo todo branco, imaculado. Uma irreversibilidade contundente, tornando densa uma atmosfera anteriormente asséptica.

Visitei "Sala de Espera" só, sem nenhum outro indivíduo no recinto. O silêncio amplificou a sensação de profundidade espacial e de deslocamento temporal. Senti-me como num lugar fictício, em que a natureza inóspita, representada pela brutalidade da madeira, conjuga-se à artificialidade do branco monocromático e totalizador. Vieram-me imagens da Islândia, um país que desconheço, mas cuja iconografia me remete aos sentimentos revelados em mim pela obra de Carvalhosa. Naquela sala de espera - espaço transitório e mágico - fiquei esperando Bjork.

PS - fotos e vídeo feitos por mim...


domingo, 24 de fevereiro de 2013

prece muda...

Fica em cartaz até o próximo final de semana, dia 03/03, a exposição denominada "Plegaria Muda", ou "Prece Muda", em português, de autoria da colombiana Doris Salcedo. 

Trata-se de um conjunto de 120 esculturas, cada uma composta pelo encontro de duas mesas de madeira invertidas, uma sobre a outra, tampo contra tampo, as mesas prensando uma camada de terra. Dispostas no 4o. andar da Estação Pinacoteca, antigo prédio do DEOPS, órgão emblemático da repressão em tempos explicitamente autoritários no Brasil, as 120 esculturas formam uma instalação a ocupar 2 imensas salas, ornadas apenas com janelas ovaladas e pilares de ferro batido, do projeto original de Ramos de Azevedo. É um espaço austero, sombrio, que se torna ainda mais sombrio quando tomado pela obra de Salcedo. 

Ao percorrer as duplas de mesas, formando um grande labirinto que dificulta nossa locomoção, percebemos com mais detalhe pequenas "graminhas", ervas daninhas crescendo dessa terra por entre as fissuras da madeira. 

Ultrapassando a primeira sala, nos deparamos com as mesmas esculturas, porém, colocadas de modo distinto, mais uniforme, até rarearem e sobrar apenas uma delas. 

Não leva muito tempo para que a repetição da obra de Salcedo nos remeta a uma atmosfera de abandono, de morte, de vida sufocada. A mesa - na instalação, todas elas usadas, com histórias próprias - tem um significado utilitário, social e cultural muito forte. É ao redor de uma mesa que partilhamos uma refeição em família, ou bebemos com amigos. Usamos uma mesa para trabalhar, para estudar, ler, escrever. Há ação e vida em torno de uma mesa. Mas não em torno das mesas reviradas de "Prece Muda". Resignificadas pois em outro contexto, em que ficam da altura de adultos, uma sobre a outra, elas passam a nos remeter à imagem de camas, de caixões, de cemitérios, onde ervas daninhas crescem a esmo. E pela repetição imagética, somada à luz baixa e ao odor da madeira, da terra e das plantas, respiramos uma atmosfera de abandono e sufocamento, de vala comum, de vida ceifada. Narro aqui sensações experimentadas por mim na visita a "Prece Muda". Não se trata, de forma alguma, de uma obra cerebral, mesmo sendo conceitual em sua origem. O trabalho de uma imagem forte, constituída por símbolos resignificados, e repetida à exaustão, são mais do que suficientes para fazer a diferença. 

Independentemente de "Prece Muda" ter sido concebida em Los Angeles, em 2004, quando a artista colombiana se deparou com a triste realidade das mortes de adolescentes - sobretudo, latinos e negros - em brigas entre gangues (o que a remeteu à realidade de seu país, onde jovens eram encontrados mortos, em valas comuns, tidos como "guerrilheiros" ou criminosos), sua potência está na redenção das vítimas dessa violência surda por intermédio da poesia, do lirismo gerado por sua obra. Pelo sentimento universal e compartilhado de abandono, solidão, tristeza, que começa a brotar em nossas corações e mentes por intermédio do embate físico entre espectador e obra. 

Anáfora, em retórica, é a repetição de uma palavra ou grupo de palavras com o intuito de criar, no leitor ou interlocutor, a sensação de reforço, ênfase. O poeta Manuel Bandeira era um grande admirador - e utilizador - da repetição em seus poemas. Costumava dizer que, através da exaustão do mesmo pelo seu uso extenso, o resultado seria algo novo, diferente. E, em vez de igual, único, ao final.
Diferentes planos e locais onde a instalação "Plagaria Muda", de Doris Salcedo, foi exibida entre 2011-2013. A artista fez questão que essa obra fosse exibida na Estação Pinacoteca de São Paulo não apenas pela amplidão do local, mas sobretudo pelo significado histórico do prédio.
Instalação de Doris Salcedo com mais de 1500 cadeiras, prensadas entre 2 prédios em Istanbul, na 8a. bienal, em 2003. Trabalhar uma topografia da guerra e da violência já estava presente no conceito e realização de sua obra.
"Shibboleth", de 2007, no Hall das Turbinas da Tate Modern de Londres. Uma fissura de terremoto artificialmente criada em torno da qual instalou-se uma polêmica por conta dos desavisados que se machucaram por não terem prestado atenção no vão. 

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

cai guo-qiang e a arte em camadas...

Montagem da instalação "Reflection - A Gift from Iwaki", concebida por Cai Guo-Qiang na Fundação Faurschou, em Copenhagen.
A equipe de montagem do artista chinês é composta de moradores da cidade japonesa de Iwaki, de onde o barco de pesca veio.
Parte da obra depois de montada, com os fragmentos de porcelana branca.
A outra parte, com a carcaça do barco enfiada no monte de porcelana.
Um dos artistas contemporâneos mais premiados da atualidade, o chinês Cai Guo-Qiang, pousará no Brasil no dia 5 de fevereiro, simultaneamente, no CCBB de Brasília e na sede dos Correios, uma parceria que possibilitou trazer ao Brasil a exibição "Da Vincis do Povo", uma seleção de gadgets e invenções produzidas por camponeses chineses que demonstra como opera a arte de Cai Guo-Qiang (a exposição virá para o CCBB de São Paulo e, depois, para o CCBB do Rio de Janeiro).

A energia da obra de Cai Guo-Qiang advém, em grande medida, da interação do artista com comunidades ou grupos de indivíduos. Como bem demonstra a exibição solo de Cai que termina hoje em Copenhagen, Dinamarca, na Fundação Faurschou. 

Denominada "A Clan of Boats", essa mostra tem como principal atração a instalação "Reflection - A Gift from Iwaki", uma instalação com uma história de quase 20 anos, quando, entre 1993 e 1994, Cai fez uma residência artística na pequena cidade japonesa de Iwaki e, junto com seus moradores, re-significou e recuperou a história da pequena vila através da escavação de um antigo barco de pesca afundado na praia da cidade. Com a ajuda de seus moradores, Cai transformou os restos desse barco em 2 obras, as quais, em 2004, receberam uma homenagem por seus 10 anos de existência. Essa homenagem era composta de outro barco de pescador proveniente de Iwaki, somado a vestígios de porcelana branca vindos de Quanzhou, a cidade natal do artista na China. Daí nasceu "Reflection - A Gift from Iwaki", instalação que percorreu inúmeros museus pelo mundo, contando sempre com a equipe de voluntários de Iwaki para a montagem da obra - 12 toneladas do barco, mais 9 toneladas de pedaços de porcelana branca. 

A amizade de longa data entre Cai Guo-Qiang e os maradores de Iwaki tornou-se, em si, matéria-prima da instalação. Matéria viva, afetiva e emocional. Mais intensamente ainda quando Iwaki foi duramente atingida pelo tsunami de 2011. Cai doou para a reconstrução da cidade recursos levantados em leilões de suas obras. E assim a proximidade entre o artista e a população de Iwaki estreitou-se ainda mais. É justamente o resultado dessa relação de quase 20 anos que a Fundação Faurschou possibilitou recriar. Outra vez, com mais camadas, mais tempo, e mais amizade. 

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

arte em A4...

O trabalho do dinamarquês Peter Callesen é um exemplo, pra mim, do limite tênue existente entre o grande domínio sobre uma determinada técnica - no caso, o recorte em papel - e a fragilidade proporcionada pelo rigor formal. Há sempre o risco, para o artista habilidoso - no lado oposto ao artista puramente conceitual - de se restringir ao âmbito da forma. Como se o talento, o apuro técnico, pudessem compensar qualquer proposta poética. 

Em suas próprias palavras, Peter Callesen justifica o uso da folha de papel sulfite A4 como uma modo de transformar algo de uso banalizado em nossa época em matéria artística. Ele acrescenta que seus temas buscam jogar com essa fragilidade do papel, explorando suas potencialidades materiais. 

Passando de uma série simples de recortes para quadros emoldurados até chegar a esculturas mais elaboradas, a obra de Peter Callesen desdobra-se e constrói-se por meio da neutralidade branca do papel. Uma limitação que, no caso do artista dinamarquês, transformou-se em potência, força.

sábado, 26 de janeiro de 2013

a "artequitetura"...


Daniel Arsham é um artista contemporâneo norte-americano que não se conteve na bi-dimensionalidade da arte. Escapou para a terceira dimensão, enveredando pela escultura, instalação, performance e pela intervenção arquitetônica e cênica dos espaços expositivos. Não se trata exatamente de um caminho pela arte site-specific, mas é inegável que seus mais recentes trabalhos, como a individual denominada "the fall, the ball, and the wall", no ano passado, na galeria OHWOW de Los Angeles, quer discutir os limites espaciais em que vivemos, discutir as interações entre os espaços construídos e a realidade ao redor. Com intervenções minimalistas, em fundo branco, Arsham brinca com a rigidez arquitetônica de tetos e paredes como nós os conhecemos funcionalmente - deixam de ser placas a dividir e separar ambientes para se tornarem matéria viva, que amortecem pesos que caem, escondem e revelam corpos, que se fundem de maneira sutil e ao mesmo tempo dramática com outras formas esculturais do quotidiano (relógios, lâmpadas, caixas de correio, saídas de ventilação de ar). Uma "artequitetura"...