segunda-feira, 20 de maio de 2013

o princípio do eterno retorno...

Rooney Mara interpreta Emily, a esposa de Martin Taylor (Channing Tatum), ex-presidiário recém-libertado por fraude financeira. Com a libertação do marido, Emily passa a ter sérias e recorrentes crises de depressão (tentativas de suicídio, ataques de pânico). Anteriormente tratada pela Dra. Victoria Siebert (Catherine Zeta-Jones), quando da prisão do marido, ela passa a ser medicada pelo Dr. Jonathan Banks (Jude Law), um psiquiatra ambicioso à frente do lançamento no mercado de uma nova droga anti-depressiva de grande potência, mas com efeitos colaterais ainda pouco conhecidos.  
Em uma entrevista concedida à NBC, o diretor norte-americano Steven Soderbergh, ao falar de seu mais recente - e parece que último - trabalho, um melodrama biográfico sobre o pianista super kitsch Liberace, declarou ver uma semelhança entre este e um de seus primeiros filmes, o premiado "Sexo, Mentiras e Videotapes", vencedor da Palma de Ouro em Cannes há 24 anos. De acordo com Soderbergh, "Sexo, Mentiras..." levou 36 dias para ser rodado, enquanto "Atrás do Candelabro", o filme sobre Liberace, apenas 30. Ser conciso, rápido, seria uma de suas características; ele não saberia fazer diferente, esticando a produção e a pós-produção de um longa ao máximo a fim de obter uma suposta obra-prima. 

Sabe-se que Soderbergh, além de rápido, é multi-funcional no cinema: ele escreve, fotografa, monta e dirige. Sabe-se também que conduziu sua carreira entre a vertente mainstream de Hollywood e o cinema indie. Fez blockbusters e filmes-cabeça. E, nesse exato momento, quando afirma não querer mais trabalhar para a indústria cinematográfica norte-americana, quando seu "Atrás do Candelabro", também na competição oficial de Cannes neste ano - mais um ponto em comum com "Sexo, Mentiras,..." - será exibido diretamente no canal a cabo HBO no dia 26 de maio, não deixo de associar a trajetória de Soderbergh ao princípio nietzscheano do "eterno retorno". Porque a primeira impressão passada pela trajetória filmográfica de Soderbergh é a de que ele cumpriu um grande ciclo, retornando ao ponto de origem, como na metáfora da cobra que morde o rabo e fecha um círculo em si mesma. Como se houvesse uma contradição, uma espécie de polarização entre suas realizações hollywoodianas tipo "Ellen Brokovich" e a franquia "Ocean's Eleven" e filmes como "Bubble" ou "Confissões de uma Garota de Programa".

Indo mais a fundo, não só o conceito de "eterno retorno" em Nietzsche não tem tal caráter cíclico e tenso entre pólos como também a obra de Soderbergh é muito mais complementar e diversa do que irreconciliável entre suas partes. Penso que o mal-entendido se configura nos 2 casos. Eterno retorno significa multiplicidade de realidades, coexistentes, e não ciclos que vão e vem. Paralelamente, um realizador que joga em várias posições criativas e faz filmes de estilos tão diversos, com orçamentos tão díspares e para públicos tão diferentes é, a meu ver, um criador de múltiplas realidades dentro de uma obra diversificada. Por que essa mania de termos que definir um estilo único como forma de sermos mais autorais? Questiono tal raciocínio.

Só sei dizer que "Terapia de Risco" (2013) - "Side Effects" - penúltimo filme de Soderbergh recém-estreado aqui no Brasil, é um exemplo muito bem acabado dos múltiplos talentos e qualidades do diretor. Drama denúncia num nível macro e um thriller de suspense, numa perspectiva micro, fiel à linhagem hitchcockiana de mocinhas-vilãs, ou vilãs-mocinhas, à la "Marnie", "Terapia de Risco" consegue compor, em camadas, a realidade hiper-mega-capitalista da indústria farmacêutica dos anti-depressivos com a impotência do indivíduo contemporâneo diante de sua realidade, diante do esforço de elaborá-la, de superar as frustrações e garantir um mínimo de satisfação sem que, para isso, seja obrigatório fazermos um pacto faustiano com a eterna juventude, o eterno prazer, a alegria agora e para sempre. Sem custo e sem preço. 

Quem não toma o seu Prozac, não fuma sua maconha ou não bebe o seu whisky, que atire a primeira pedra.

Ah, e por favor, Soderbergh, reconsidere voltar a filmar, nem que seja só pra televisão...

Nenhum comentário:

Postar um comentário