quinta-feira, 14 de março de 2013

cópia ou fonte de inspiração...

Tela do pintor espanhol Diego Velázquez, de 1650, na qual o papa Inocêncio X está retratado.
"Estudo segundo Velázquez" é o título da obra do pintor britânico Francis Bacon, de 1953,  tendo como base dialógica o retrato executado no século XVII pelo pintor espanhol.
Que nenhum artista cria do nada, mesmo que a referência não seja algo explícita para ele, ou mesmo consciente, é ponto pacífico. Há, porém, aqueles artistas cuja obra pretende justamente questionar a originalidade. Fiquemos apenas em Andy Warhol e suas reproduções de Marilyn e Liz Taylor, ou da lata de sopa. Daí a alguém pegar um obra alheia e apresentá-la com sua assinatura, a coisa muda bem de figura. 

O exemplo é pequeno, mas é o meu exemplo: uma foto feita por mim de uma arte de rua aqui em São Paulo postada há uma semana no instagram e, eis que, de repente, agora há pouco, vejo a minha foto no perfil de um seguidor, sem ao menos creditar minha autoria. Será que eu estou exagerando? Me senti roubado. Por pequenino que tenha sido o delito. Mas ver outras pessoas curtindo ou elogiando a foto no perfil de outrém - e a minha capacidade criativa no anonimato - dá raiva. Um certo sentimento de injustiça, exclusão. 

A propósito, li essa semana na Piauí do mês de março sobre como a viúva do escritor argentino Jorge Luis Borges, Maria Kodama - sua ex-secretária - vigia e administra com pulso de ferro o patrimônio autoral de seu falecido marido. A ponto de, recentemente, processar um jovem escritor argentino, Pablo Katchadjian, a ressarci-la por uso indevido do famoso conto "O Aleph", de 1945. Katchadjian utilizou o conto de Borges, no qual o personagem principal se depara com um pequeno objeto que contém em si tudo o que existe no universo, como base para seu livro, "O Aleph Engordado", de 2009. Nele, o autor acrescenta mais 5 mil vocábulos aos 4 mil existentes no conto original, criando, dessa forma, um híbrido. 2 anos se passaram para Kodama descobrir a existência de "O Aleph Engordado" e, em seguida, processar Pablo por plágio. No cabo de guerra tencionando ambas as partes está a questão fundamental: Katchadjian criou uma outra obra literária, com sentido e significado novos, ou o uso de "O Aleph" foi abusivo. Mesmo com toda fama de megera de Kodama, Pablo não deveria tê-la procurado para informar o que pretendia? Ou ele não o fez por medo de saber de antemão a resposta? Um sonoro não.

Em 1650, Diego Velázquez retratou o papa Inocêncio X. A tela está em exibição permanente no Palácio Doria-Pamphili, em Roma. É um retrato impressionante, vigoroso e cruel. Um retrato do poder personificado, um retrato essencial para os estudos posteriores de história da arte e para as diversas poéticas artísticas que se seguiram. Em 1953, o pintor britânico Francis Bacon fez um estudo sobre o original de Velázquez. Com sua poética do horror, ele ressignificou o retrato de Inocêncio X feito um alien, um símbolo da corrupção visceral do poder. Bacon, desde o início, teve essa intenção: a de dialogar expressamente com a pintura de Velázquez. E obteve originalidade ao recriar e atualizar, em seu próprio estilo, essa representação já consagrada. Sem carnavalização, vulgarização ou infatilização. Ou mesmo sem vampirizar o primeiro original. 

Respondam-me, então: qual é a medida da originalidade? 

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