quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

é proibido proibir...

Capa do álbum "Estrangeiro", baseada no cenário de Hélio Eichbauer para a montagem do Teatro Oficina da peça "O Rei da Vela", de Oswald de Andrade... 
Quando Caetano lançou o álbum "Estrangeiro", em 1989, meu pai já havia morrido. Era o primeiro disco de Caetano depois de sua morte. E era a renovação daquilo que meu pai sempre costumava falar do compositor e cantor baiano, "eu gosto dele porque ele busca refletir seu tempo, sem ser perfeito". 

Trabalhar o presente e re-contextualizar o passado como legado é algo que valorizo num artista. Uma identificação paterna. Quando vi a capa de "Estrangeiro", o cenário de Hélio Eichbauer para a montagem premiada de 1967 do Teatro Oficina da peça de Oswald de Andrade, "O Rei da Vela", já pressenti que Caetano iria tratar da questão da identidade da cultura brasileira, identidade nacional cheia de contradições. Como os estrangeiros nos veem, como nós absorvemos os estrangeiros, e será que essa via é de mão dupla? 

Arto Lindsay foi o produtor do álbum, e a faixa de abertura tem o nome de "O Estrangeiro". A letra fala das impressões de artistas e intelectuais estrangeiros em relação à Baía de Guanabara. Os que a detestaram e aqueles que se encantaram por ela. Fala da percepção do próprio autor em relação a ela e ao restante da geografia do Rio de Janeiro. Geografia que gerou o movimento concretista brasileiro, geografia que induziu à convivência próxima de classes desiguais, nossa violência e criatividade miscigenadas.

1989 era o ano da queda do Muro de Berlin. A globalização cultural vivia um momento único, de aceleração. As dúvidas eram maiores que as certezas, e as esperanças refletiam uma mistura de vontade de mudança com medo de novas ditaduras. 

Toda vez que escuto essa canção, me remeto a uma pregação, a um manifesto. Um manifesto às avessas, no qual se fala de clareza e cegueira, de uma identidade nacional que não assume sua hipocrisia e seu racismo, não assume seu deslumbre. Uma cultura que se paralisa quando tenta ser purista, "riscar os índios, nada esperar dos pretos". Riscar o estrangeiro.

E como o próprio Caetano finaliza, em inglês, "some may like a soft brazilian singer, but i've given up all attempts at perfection".

Nenhum comentário:

Postar um comentário