segunda-feira, 1 de abril de 2013

a caça...

A Dinamarca não chega a ter 6 milhões de habitantes. É uma península minúscula na Escandinávia, a qual junta-se uma série de ilhas para compor seu pequeno território. Comparativamente aos seus limites geográficos, o audiovisual contemporâneo - TV e cinema - produzido na Dinamarca, ao contrário, apresenta qualidades que ultrapassam, e longe, suas fronteiras. 

Desde Carl Dreyer, um dos mestres precursores do cinema, até o movimento Dogma 95, criado por Lars von Trier e Thomas Vinterberg, os quais pregavam o realismo estético, o foco no roteiro, na atuação dos atores, menosprezando os recursos tecnológicos e de efeitos especiais, o cinema dinamarquês vem se consolidando como referência poética atual, marcando presença nos principais festivais internacionais, e sendo visto e consumido em inúmeros países. 

"A Caça" (2012), de Vinterberg, reafirma essa relevância (infelizmente, em exibição em apenas uma sala em São Paulo). Revisitando o tema do abuso sexual na infância, abordado em seu longa de estreia, "Festa de Família (1998), Vinterberg apurou seu estilo dentro dos moldes do manifesto do Dogma - um cinema mais simples, realista, muito distinto do maneirismo trilhado por seu conterrâneo von Trier. Ao mesmo tempo, essa simplicidade não pode ser jamais traduzida por uma pobreza de estilo, ou num minimalismo. A trama de "A Caça" vai sendo tecida de maneira muito semelhante a uma sinfonia clássica, com crescimento de tensão, com extremo apuro estético - a fotografia em tons escuros e marrons do outono dinamarquês -, com uma violência que aparece tanto explicita como implicitamente, em símbolos e sub-textos. 

Até chegarmos ao final duplamente espetacular: pelo clímax da sequência da igreja, de grande tensão dramática, até o aturdimento "à la Godard" do espectador frente à paranoia perene que se instala no protagonista inocentemente caçado pela comunidade da qual faz parte.

Metáfora da incivilidade da civilização humana - sempre obrigada a coabitar com a barbárie - "A Caça" nos fala da violência surda a qual, de algum modo, estamos submetidos quando vivemos em sociedade. Há sempre bodes expiatórios, indivíduos ou grupos alvo de algum tipo de ação violenta que, simbolicamente, dê conta de apaziguar o recalque e a insatisfação da repressão coletiva do ajuste de cada um no todo. 

Isso sem falar na atuação de Mads Mikkelsen, que lhe valeu o prêmio de melhor ator no festival de Cannes do ano passado.

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