Capa da edição brasileira, pela Companhia das Letras. |
O que falar, então, desse desafio para uma iniciante de apenas 23 anos, Carson McCullers - pseudônimo literário de Lula Carson Smith -, ao publicar seu primeiro livro, em 1940, "O Coração é um Caçador Solitário".
Em muito pouco tempo, a obra de estreia de McCullers obteve reconhecimento de público e crítica, e, desde há muito, figura entre os clássicos da literatura de ficção norte-americanos do século XX, ao lado de livros como "O Som e a Fúria" e "Luz em Agosto", de William Faulkner.
Cito Faulkner porque vejo muitas semelhanças entre a literatura de ambos - o retrato do sul norte-americano, um outro país dentro de um país, uma região rica em preconceitos e pobre em oportunidades, reflexo de uma cultura orgulhosa em sua imutabilidade.
No caso de "O Coração é um Caçador Solitário", há uma grande dose de ousadia da autora ao abordar temas polêmicos nesse cenário primitivo - pedofilia, homossexualismo, comunismo -, misturados ao racismo e conservadorismo sulistas tão arraigados e já conhecidos.
As 5 histórias dos 5 personagens entrelaçam-se; cada capítulo tem como voz narrativa um desses personagens. Para alinhavar essas diferentes perspectivas está o personagem convergente da trama, o mudo John Singer, um homem solitário e enigmático que todos na comunidade reputam como um grande sábio, quase um santo. Ele é o file depositário da solidão e do flagelo dos outros 4 personagens, os quais se vêem capturados pelo mundo ao redor, pelo sentimento de impotência.
Em tempo: lembro-me de ter me surpreendido com o cineasta Luis Buñuel quando ele afirma em sua auto-biografia, "Meu Último Suspiro", que sempre havia desejado fazer um filme chamado "O Anjo Exterminador", não importasse qual fosse a história. O que lhe obcecava era esse nome, o título sobre o anjo assassino.
Depois de finalizar "O Coração é um Caçador Solitário", ficou-me a impressão de que esse livro havia pedido para ser escrito, que esse título devia estar impresso na mente de Carson McCullers, como a obsessão de Buñuel. Porque não há título mais adequado a essas pequenas histórias de indivíduos desafortunados, todas tão belas quanto trágicas.
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