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domingo, 9 de março de 2014

dis de dislexia...

Modelos embaladas a vácuo no desfile-display da designer holandesa Iris Van Herpen na semana de moda de Paris há alguns dias atrás. Onde supostamente deveria haver movimento, fluidez,  aprisionamento, imobilidade. 
Dentre os sentidos do prefixo "dis" estão os seguintes: separação, negação, contrário, dificuldade, contrariedade. Distração: falta ou dificuldade de atenção; distopia: posição ou situação anormal de um órgão do corpo humano. Ou o contrário de utopia: a separação dos ideais de liberdade e igualdade, e a organização social da realidade - caótica, violenta, sem sentido. Dislexia: dificuldade com o "lexus", a palavra, com o ler e escrever. Negação do tempo de refletir, compreender, interpretar. 

Fukaeri é a adolescente introvertida, monossilábica, misteriosa; a menina diagnosticada como disléxica, que não consegue se ater muito tempo à leitura e à escrita, mas capaz de criar uma história fantástica e absolutamente original que fascina um cínico editor e um escritor-to-be na trilogia "1Q84" de Haruki Murakami. 

Fukaeri fala pouco, não consegue formular questões; mistura um vestido de algodão leve de verão com um casaco de neve para o inverno pesado; é quase inexpressiva. Fukaeri, apesar dos seus 17 anos, comporta-se como um traumatizado de guerra, como um indivíduo que passou por tantos revezes na vida e que, por isso, sua única resposta é o silêncio, o olhar parado no infinito.  

Não sei exatamente explicar porque esse blog foi interrompido: uma distensão entre setembro do ano passado e o dia 9 de março deste ano. Feito Fukaeri, quero dizer não, refutar, dizer que não compreendo o que vem acontecendo ao meu redor ao longo desses meses. Com o olhar perdido no horizonte, recomeço a escrever por aqui. Sem pretensões, sem alvo, sem direção. A grande vantagem é a de que, se eu bater em alta velocidade contra um poste ou uma árvore, capotar inúmeras vezes, e deslizar barranco abaixo, ainda assim continuarei vivo. Terei voltado a arriscar.  

quinta-feira, 11 de julho de 2013

androginia...

Saskia de Brauw, 32 anos, é hoje uma das queridinhas do mundo da moda. Por "queridinha" entenda-se uma das modelos mais requisitadas para editoriais de moda, campanhas de marcas renomadas, como Givenchy, Versace, Fendi e Saint-Laurent, desfiles no circuito Paris-Milão-Londres-NYC, além de ser capa das principais Vogues e revistas de moda e tendências desde 2011. 

Saskia está de volta a uma carreira que iniciou e abandonou quando tinha parcos 16 anos. Achava que aquela vida não era para ela; queria estudar arte, e então ingressou na Gerrit Rietveld Academie de Amsterdan. Formada e com um trabalho que mescla fotografia, instalação e poesia, de Brauw decidiu retornar à moda, aos 29 anos. Foi rapidamente devorada pela demanda por modelos de jeito andrógino e, ao mesmo tempo, voluptuosas, um momento da moda em que as mulheres feitas estão em alta, em detrimento de ninfetas e new faces

Se a formação em artes visuais serviu de empurrão para esse sucesso todo, não há como saber ou medir. Mas, sem dúvida, a atitude de tomboy em corpo de mulherão, sua postura provocativa e distante diante das câmeras advém de uma consciência e um repertório de moça cultivada, madura. Não à toa ela está com tudo e não está prosa. 

segunda-feira, 3 de junho de 2013

o medo da polêmica...

Não sei se é por conta dos meus óculos novos; se é por que eles me remetem à figura estranha do fotógrafo americano Terry Richardson; se isso se junta ao post sobre o filme ganhador da palma de ouro no festival de Cannes, no qual longas sequências de sexo explícito entre as personagens principais causaram furor e elogios da crítica; não sei se por causa do meu total repúdio ao rebaixamento e à violência impostos à condição da mulher em vários países do oriente (falei dos "acid attacks"); não sei se por que ontem foi a parada gay aqui em São Paulo; não sei se por que adoro as mulheres (leiam-se modelos) que fazem parte desse editorial de 2009/2010 da revista Purple Fashion; se por que o estilo de Richardson fica entre o vulgar e o erótico; se é por conta de uma incoerência minha, gostar de corpos femininos que correspondem a 0,01% da população de mulheres no mundo; se não é também outra contradição defender a igualdade de direitos entre os gêneros e curtir esse editorial; ou se, no fundo, eu não estou me tornando um chato politicamente correto e confundindo as bolas. De toda essa bagunça retórica, tiro o seguinte: mesmo sendo moda, mesmo sendo comoditizada, as imagens femininas retratadas no editorial da Purple, de modelos nuas simulando situações homo-eróticas, são algumas das poucas coisas boas que o capitalismo permite. Ele pode arrasar com costumes ancestrais, com valores tradicionais, com laços e vínculos culturais. Mas pode também, por meio da igualdade de direitos de consumo - claro, se você tiver dinheiro -, propiciar o exercício individual da liberdade sexual. Ou, no pior dos mundos, ficarmos a meio-caminho: sem referências culturais e à mercê do capital. 
Fui longe demais nos argumentos, tenho consciência. Justifico-me excessivamente, eu sei. Já se tornou uma característica minha. Muito provavelmente reforçada pelo medo da polêmica, de ser mal-interpretado ou entendido. Inevitável, como também inevitável o acirramento de nossas contradições em tempos hepáticos como os de hoje. Então fiquemos simplesmente com as fotos desse editorial clicado por Terry Richardson para a Purple, com Freja, Magdalena, Eniko e Abbey Lee. E cada um que tire sua própria conclusão, faça seu julgamento e sua apreciação. Eu confesso que gosto - dessas meninas, do ensaio, e da polêmica... Do Terry Richardson, non troppo...

sábado, 25 de maio de 2013

a pintura afetiva...

Autorretrato com pintura da série "Escócia", fotografada por Roo Lewis em 2013.
A morte da minha avó materna, há 12 anos, acelerou um processo, já iniciado anteriormente, quando ela não podia mais morar sozinha, de divisão dos objetos que também habitaram, pelo mesmo período, a casa em que ela vivera por mais de 5 décadas. Móveis, tapetes, lustres, espelhos, quadros, esculturas, porcelana, fotografias - muitas fotografias -, uma coleção de coisas herdadas e adquiridas por ela e meu avô. 

Eu adorava aquela casa. Absolutamente tudo nela. O jardim era imenso. Um alpendre também espaçoso, onde costumávamos passar as tardes, quando eu ouvia as conversas de minha avó e suas irmãs, suas cunhadas, minhas tias, mãe, meus primos e primas. E a casa em si, tudo o que pertencia a ela; parecia que tudo havia sido milimetricamente planejado para ocupar aquele espaço. 

Apesar da notória prevalência feminina, o mundo dos objetos dizia mais sobre o meu avô do que sobre ela; afinal, havia sido ele o colecionador da maioria do que ali esteve, quem projetara e construíra a casa, quem, durante viagens, trouxera debaixo dos braços bustos de mármore, espelhos venezianos, pinturas feitas a seu pedido de pescadores do sul da Itália (lembro-me perfeitamente dessas pinturas; costumava explorar o interior daquela casa como que maravilhado, à espera de uma nova surpresa, como quando descobri, no verso do quadro dos pescadores, uma foto puída, em preto e branco, feita por meu avô no momento do registro). 

Havia também um quadro enorme, muito curioso, encimando o sofá maior da sala de estar. Ele tinha medidas de quadro de museu, era bem grande, com molduras rebuscadas. Por muito tempo me perguntei por que justamente aquela tela ocupava tamanho destaque. Era uma pintura sombria. Retratava uma cena doméstica inusitada. Uma moça, em cima de um banquinho, com gestos de assustada, e outra, no canto esquerdo, agachada, vassoura em punho tentando caçar o que deveria ser um rato, o motivo do pavor da moça em primeiro plano (confesso que descrevo o que me lembro, o que se fixou na minha memória; outros detalhes ou figuras do quadro me escapam). 

As pinturas do que não existe mais da casa dos meus avós espalharam-se pelos descendentes. Vez ou outra me deparo com um deles na casa de meu irmão, de uma prima. Já não pertencem mais a um mundo conhecido, familiar; estão em outro contexto, pelo menos para os meus olhos (aqui não vai nenhum juízo de valor negativo). Apenas não sinto mais por eles o mesmo afeto que tinha quando todos encontravam-se reunidos no espaço afetivo de casa de avó. Porque o que me fazia achar beleza neles era isso, o caráter de pertencer àquele lugar, de compor uma atmosfera que me trazia aconchego, independentemente de qualidade artística ou avaliação estética. Não se costuma dizer que a beleza está no olhar de quem vê? 
Edie Campbell por Peter Lindbergh: lembrar daquela casa me suscita uma atmosfera parecida.
   

quarta-feira, 22 de maio de 2013

black is beautiful...

2 coisas, e rápidas, porque as imagens merecem o destaque: 1). por que é tão difícil encontrar editoriais de moda em revistas brasileiras com um refinamento desses (destacam-se pra mim a modelo Melodie Monrose, e o styling de Beth Fenton); 2) e o preconceito com a moda como arte, ou a fotografia de moda, se há tantos outros truques e artifícios na arte contemporânea? (moda e fotografia de moda pode ter um conceito bem amarrado e realizado; ah, e tanto a moda como a arte contemporânea emparelham-se na comodização: fazem seu preço e se vendem; tudo bem, concordo que a moda tem as suas limitações, mas também não está sendo fácil encontrar uma arte que nos retire da zona de conforto, que nos chacoalhe).

Bom, depois do blá-blá-blá, vamos ao editorial de nome "Retro Fitted", um revival atualizado das formas, da blocagem de cores, dos geomestrismos, dos cortes e da modelagem, das estampas dos anos 60. Fotografado por Mariano Vivanco e com a participação do modelo Kone Sindou. 

segunda-feira, 13 de maio de 2013

o bruxo de los angeles...

Campanha pré-outono 2013 da Saint-Laurent, estrelada pela modelo sueca Freja Beha Erichsen, encarnação do estilo de beleza e atitude da nova marca comandada por Hedi Slimane.
Em 2007, Hedi Slimane mudou-se para Los Angeles. A ele interessava não apenas a Costa Oeste norte-americana, a Califórnia, mas os ícones, os símbolos, o modo de vida dessa estranha e desconhecida metrópole. 

Sem preconceitos, Slimane abraçou L.A. como matriz de sua recente fase criativa, seja na fotografia, seja na moda. Depois de uma longa temporada na Dior Homme, no início dos anos 2000, época em que redefiniu a silhueta masculina de forma radical e contundente - com seus modelos macérrimos, de preto, calças mega skinny, maxi regatas, pele, osso, e atitude. 

Nascido em Paris, de mãe italiana e pai tunisiano, também viveu em Londres e Berlin. Um certo nomadismo asceta já faz parte de sua persona e, por decorrência, de seu trabalho. Super conectado ao rock, ao folk e ao pop desde criança, David Bowie era seu ídolo maior. Ídolo que só veste suas roupas quando soube aos palcos. Assim como toda a geração de bandas indies e do novo rock inglês e americano surgida nos anos 2000. 

Desse ascetismo também vem sua paixão pela arte conceitual norte-americana. Tanto que, em 2011, foi o curador responsável pela mostra "Mitos e Lendas de Los Angeles", a qual percorreu Paris e Bruxelas com uma exibição de artistas californianos como Ed Ruscha, John Baldessari, Chris Burden e Sterling Ruby. Ele próprio exibiu sua obra fotográfica no MOCA, de nome "California Song".

E é nessa pegada de revival dos anos 70, de movimento hippie, mesclados aos novos movimentos estéticos e de intervenção urbana na cena artística de Los Angeles que Slimane encontrou sua concepção de contemporâneo. A atualização do seu conceito de elegância e irreverência, de ligação entre moda, artes visuais, música e comportamento. 

Yves Saint-Laurent deve estar se revirando no túmulo. Desde 2012, Hedi Slimane, no comando da marca, sugeriu a alteração do nome - já incorporada - para Saint-Laurent apenas. Alteração notável também na nova silhueta feminina criada para a grife. Sai o étnico e a beleza feminina, e entram as ruas de Los Angeles, as feiticeiras e drogadictas, as ex-hippies e novas indies, as personagens eternamente jovens e diáfanas do "Nosferatu" Slimane.   

segunda-feira, 22 de abril de 2013

viviane sassen, dentro e fora da moda...


Recentemente publicado em fevereiro, o livro "Viviane Sassen: In and Out of Fashion" faz uma compilação da carreira da fotógrafa holandesa. Viviane passou parte da adolescência na África, o que influenciou profundamente seu trabalho, não apenas por conta das cores, mas também pelos elementos esculturais e gráficos nele presentes. Some-se a isso um olhar muito subjetivo - explico melhor, muito feminino - de seus retratados. O que, na minha percepção, se reflete em composições surreais e densas, de grande intimidade, revelação e ocultamento dos corpos em foco. 

Seja no mundo da moda, no qual a fotógrafa se firmou como uma das mais requisitadas, seja em seu mundo de interesse particular, meramente artístico, a obra de Sassen desvela uma perspectiva contemporânea altamente refinada, estudada em cada detalhe, sem distinção de apuro visual e poética para editoriais e campanhas publicitárias de trabalhos seus executados fora desse universo. Dentro ou fora da moda, a obra de Viviane Sassen é única, indistinta e autoral.