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quinta-feira, 2 de maio de 2013

o olhar do outro...

Série de fotos do projeto "Wait Watchers", de Haley Morris-Cafiero.
Em tempos de renovação e reafirmação de preconceitos, já não basta mais ser mulher, ser negro, ser gay. Ter um corpo fora dos padrões ditados pelo mercado de consumo era o novo preto que faltava no mundo fashion dos julgamentos sociais. "Fora dos padrões" é eufemismo. Sejamos mais diretos. Quando você está dentro de um ônibus e um passageiro entala ao tentar passar pela catraca - motivo: seu porte avantajado -, você desvia o olhar ou não resiste, e encara o constrangimento da cena? 

À fotógrafa norte-america Haley Morris-Cafiero, não foi possível resistir à posição passiva de apenas receber o olhar julgador dos outros por suas medidas XXL. Morris-Cafiero decidiu contra-atacar. Saiu de trás da câmera e colocou-se diante dela, em situações do quotidiano aparentemente banais, como atravessar uma rua, tomar um sorvete, tirar foto como turista ou ir à praia. A única exigência: gente ao redor, para que, por intermédio da colaboração de um outro fotógrafo com câmera em punho, fosse possível registrar o olhar dos outros (ou do Outro psicanalítico, todos os outros em um só) em relação à sua figura "fora dos padrões". 

Já falamos aqui um pouco sobre a questão do autorretrato, e um pouco também sobre performance, suportes em que o artista se insere no objeto da criação artística. Mais intimidade, maior controle dos resultados, além de uma conexão subjetiva mais forte com o espectador, são razões alegadas para essa participação do artista como matéria. Em especial, aqui, o projeto "Wait Watchers" de Morris-Cafiero tem um ingrediente a mais, peculiar. A questão do preconceito e, mais ainda, do registro revelador do olhar dos outros sobre nós. Não à toa vivemos tempos em que já incorporamos uma visão distorcida de nós mesmos, em função da "doença de agradar" a tudo e todos. Impossível, subjetivamente, dar conta disso, sem gerar neuroses ou paranóias, se todos os parâmetros de validação do nosso ego estão fora, num imenso desequilíbrio. Morris-Cafiero que o diga. Outros, porém, já diriam: por que ela não dá uma emagrecida?

segunda-feira, 29 de abril de 2013

a exposição iminente...


Autorretratos do fotógrafo norte-americano Lee Friedlander.
Entrei no museu ainda vazio. Pouca gente circulava por lá. Mesmo assim, a sensação era de abafamento. Caiam imagens sobre minha cabeça, e eu não conseguia fixá-las. Uma ou outra fotografia me atraiam a atenção, mas o conjunto se anulou em mim. Em minha percepção, intransferível. 


Saí do museu. Bebi 2 cervejas com um amigo. Falamos da exposição. Do que estava ao redor, não das fotos. Sensação estranha, porém nada desconfortável. Logo passamos pra outros assuntos, para simplificar a noite.

Já bem distante do museu, em casa, me olhei no espelho, lavei o rosto, e me percebi menos importante. Aquele reflexo, pelo menos. Sorri, pra ver quantas marcas ao redor dos olhos se formavam. Menos rugas no olho direito do que no esquerdo. Fiz mais caretas, massagens faciais, estiquei e soltei a pele da cara várias vezes. Difícil envelhecer, fácil exagerar. Fechei os olhos com força, abri-os de supetão. Nada de mais. Não cabe a mim me ver. Isso é função dos outros. Cabe a mim estar presente. 

quarta-feira, 3 de abril de 2013

beleza americana...






William Eggleston nasceu no Tennessee, e foi criado no Mississippi. No sul profundo norte-americano. Sempre afirmou que, quando criança, sentia não se enquadrar naquele universo. Mas que, mesmo assim, sabia que pertencia a ele, invariavelmente. Muito provavelmente, dessa relação paradoxal de olhar estrangeiro e, ao mesmo tempo, familiar, é que vêm a crítica e a generosidade
 de sua obra fotográfica quando representa o ordinário e o banal da realidade sulista dos Estados Unidos, ao lado da qual convivem a violência e o vazio existencial de algum sonho perdido. 

Se continuamos a percorrer os meandros dessa lógica, pode-se explicar a opção de Eggleston pela impressão por transferência de tinta (dye-transfer print) - ou tampografia, em português - uma técnica de ponta no início da década de 1970, utilizada, sobretudo, para cartazes, placas e objetos de propaganda com uso diverso de cores e contrastes (tipo um grande placar com a logo da Pepsi ou da Coca-Cola). Eggleston transferiu o uso saturado de cores das peças publicitárias para o idioma e a sintaxe de sua fotografia. Pioneiro do uso abusado da cor no suporte fotográfico, inicialmente visto com maus olhos pelos críticos de arte da época, Eggleston também foi um dos primeiros a expor fotos coloridas no MoMA de Nova York, a conferir status artístico à cor na fotografia. 

Olho para as fotos de Eggleston e vejo uma continuidade, um diálogo com a pintura hiperrealista norte-americana. Não apenas no uso das cores, como também nos temas e no enquadramento, o foco no vernacular, em outdoors perdidos na estrada, postos de gasolina, no barato e pequeno da vida, em interiores domésticos quentes e inóspitos, ou em áridas panorâmicas externas. Uma churrasqueira pode ser assustadora. Um quarto de motel e um triciclo infantil, solitários. E as figuras humanas, meio esvaziadas, meio displicentes. Embora sempre cheias de calor.