Um livro que recomendo fortemente àqueles interessados em se aprofundar em fotografia, para aqueles que apreciam e sobretudo tiram, fazem e analisam fotografia, mesmo que por hobby ou paixão, é "Filosofia da Caixa Preta" de Vilém Flusser. Editado pela Annablume e curtinho - pouco mais de 100 páginas - "Filosofia..." tem um texto direto e enxuto. Muito claro nos objetivos pretendidos pelo autor. Traçar conceitos e categorias para uma filosofia da fotografia - e aí vou mais longe, penso que Flusser lança sementes para uma epistemologia da fotografia: história, sociologia, economia da fotografia, como a arte e o fazer fotográfico são influenciados e influenciam a cultura contemporânea.
Sem notas de rodapé ou citações - algo raríssimo num ensaio teórico - Flusser afilia-se a uma certa corrente bressoniana da fotografia como roubo, caça ou captura. Vai muito mais longe, ao enfatizar a relação essencial entre fotógrafo e câmera fotográfica, como essa relação é determinada pela afinidade e conflito entre quem aperta o botão - uma subjetividade com conceitos na cabeça - e o aparato tecnológico que processa a imagem capturada em formato ampliável e reproduzível. Não se trata aqui apenas de domínio sobre a tecnologia, mas sem dúvida Flusser afirma que o fotógrafo precisa ter essa noção de quais técnicas estão a seu dispor, sob seu domínio, inclusive como prováveis recursos ainda inexplorados e passíveis de resultarem em falhas (o que não obrigatoriamente significa algo ruim ou indesejável).
Outra consideração relevante: uma foto, apesar de ser apenas um pedaço de papel bi-dimensional, ela, muitas vezes, não cria ou faz sentido sozinha. Isso porque a riqueza de seus elementos estão relacionados a 3 dimensões: à própria realidade, a uma posição política ou comportamento, e a um dever ser da imagem, a uma busca estética. Portanto, Flusser fala sobre obra fotográfica, um conjunto inter-relacionado, tanto mais rico e significativo quanto mais conseguir enlaçar esses 3 aspectos, quantitativa e qualitativamente.
Entre 1969 e 1988 o fotógrafo Joseph Szabo registrou adolescentes norte-americanos. Em branco e preto, em diferentes texturas, situações, suas fotos poderiam se distribuir em diversas categorias - foto-jornalismo, crônica geracional, crítica cultural, registro de comportamento, proposta estética, enfim, seu conjunto - aqui, apenas destacado em 8 fotografias - transitariam com desembaraço por vários meios como jornais, revistas, livros, ou as paredes de uma galeria de arte. Um exemplo de fotografia em termos flusserianos...
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segunda-feira, 26 de agosto de 2013
ciência, ética e estética...
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segunda-feira, 19 de agosto de 2013
gente como a gente...
Estreia na próxima sexta, dia 23/08, a comédia indie que conquistou o verão norte-americano e europeu neste ano. "Frances Ha" é dirigido por Noah Baumbach, o mesmo de "A Lula e a Baleia", e contou com a participação da atriz Greta Gerwig - também protagonista do filme -, no desenvolvimento do roteiro.
Comédia indie e hit do verão no hemisfério norte soam a cafonices. Mais clichê ainda é a breve descrição geral da trama do filme: uma garota classe-média, nos seus vinte e tantos anos, já graduada, tentando se encontrar profissionalmente, sem casa ou outros objetivos de vida definidos, vagando por uma Nova York de atmosfera à la Woody Allen, onde as personagens retratadas são cools, bem-sucedidas ou meros dandies a curtir a vida cosmopolita da cidade. Pois foi por tanto desdenhar desse plot que cai do cavalo quando assisti à pré-estreia do filme, na segunda passada.
"Frances Ha" retira sua força da autenticidade da interpretação de Greta Gerwig. De um naturalismo quase clown, ingênuo, mas altamente espontâneo e, por isso, com enorme potencial de capturar a simpatia do público. Há muito tempo não me recordava tão vivamente da premissa a fundar o cinema clássico: nada além de um pacto fictício de verossimilhança entre o espectador e a narrativa. Sabemos que é tudo mentira, mas acreditamos no que vemos, entramos na história e nos identificamos ali. "Frances Ha" refrescou-me a memória, reavivou um dos fundamentos do story-telling cinematográfico.
A questão, então, não é sobre originalidade num sentido estrito. Já vimos outras histórias de desajustados, de personagens existencialmente perdidos entre o fim de uma etapa da vida e a tomada de consciência de uma nova rota a seguir. O que diferencia o filme de Noah Baumbach é a junção muito bem-sucedida entre os diálogos, extremamente sofisticados em suas variações de tom e humor, a interpretação de Greta, a fotografia em preto e branco, proposital para criar um quê atemporal, cult e ao mesmo tempo banal, ao redor das personagens. Gente como a gente, gente que somos ou conhecemos. As expectativas desequilibradas nas relações, as falhas de comunicação, as incompreensões mútuas, as inseguranças, o orgulho. Falar demais, inventar histórias, não dar o braço a torcer. Se ainda soa clichê, pensem que a Frances de Greta Gerwig consegue passar todo esses seus desajustes comuns a todos nós de uma maneira diferenciada, própria. Com bom-humor e generosidade tão genuínos que saímos do cinema nos sentindo especiais, únicos. Como essa louca correndo por Manhattan ao som de "Modern Love" do Bowie. Se eu fosse você, iria conferir...
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